A felicidade de Joaquina na estória intercalada
Quando Joaquina primeiro viu a luz, seus pés tremeram como se estivessem sob a placa de San Andreas durante um terremoto pra lá dos 8 pontos na escala Richter. Sem exagero, Joaquina ficou doida. Sua pele toda se eriçou. O pescoço se contorcia sem cuidados, sem descrição alguma. Era vê-la e tomar um susto também. Aquele calor que sobe ao corpo: braços sem força, pernas cambaleantes. Essa tensão sexual, essas coisas de sexo todas juntas nela se deram. E se deram também a amor materno, o amor fraterno, toda sorte de amor, bem dizendo, acometeu Joaquina quando ela primeiro viu a luz. E ódio e desprezo podiam ser vistos em seus olhos quando estes se abriam, e podiam ser lidos em seus lábios quando estes se mordiam. Nos movimentos de Joaquina se liam ainda os dias, os meses, sua vida toda. Era cair e lembrar da infância, levantar e ver a juventude, a conquista da independência. Se ela se lembrava de algo, as palavras se tornavam gestos. O signo, a língua, eram como um pulo que se comunicava por frases secas e fáceis de se entender. Quem viu lembra bem que qualquer articulação contorcida que se via em Joaquina lembrava perfeitamente seus traumas e medos, que ficavam sempre escondidos; até que ela viu a luz.

O mais lindo de tudo é que Joaquina não se abalou em nada. Ficou pasma, sim, mas com atitude. Todos aqueles filósofos que antes disseram suas verdades, encadernaram seu raciocínio, pingando os is e versando o absoluto, descobririam que suas palavras eram um prólogo exageradamente extenso para o que se via no rosto da menina, nua entre o povo todo, na frente, atrás e sobre o véu que sob nós separa de nossos pés o sujo chão, a úmida grama, o seco deserto. Religiosos teriam que rever seus livros em busca de novos significados para o escrito; com Joaquina, eternamente viva no instante, mudara em sua presença secular o jeito de agradecer ao divino. Também seria por ela, e não por nós, que a política dos grandes torna-se-ia a fofoca de cadeiras, a troca de boatos, o aperto de mãos entre vizinhos que se odeiam. Ao ver a luz, Joaquina nem se deu ao trabalho de caçar pudor e tampar o sexo. Pudera, esconder-se de quem a via era mentir demais. Pura que era, deixou-o a mostra, ao ar livre, para um gracioso descanso enquanto contemplado. E foi isso: o primeiro gozo de Joaquina Guarda-Beleza aconteceu quando ela lia “Tudo”. E todos entenderam a estória de Lampião sem ler do livro um palavra que fosse. Mesmo assim, quem não gostaria de lê-lo pessoalmente?
Um comentário:
Brigado, Joaquina.
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